Pe Adriano Cunha Lima (desde Chade-África)
No domingo 4 de fevereiro, durante o Angelus, o Papa Francisco convidou todos os cristãos e homens de boa vontade a dedicar o próximo dia 23 como uma jornada especial de oração e jejum pela paz no mundo, sobretudo na República Democrática do Congo e no Sudão do Sul.
Um novo convite à oração. Diante alguns problemas enormes o Papa insiste em rezar. Essa não foi a primeira vez, desde o primeiro dia do seu pontificado ele se confia constantemente às orações do povo e promete inúmeras vezes suas orações. Ele propõe jornadas de oração, como aquela organizada em setembro de 2013 pela paz na Síria, a de 2016 pelas vítimas de abuso sexual, sem esquecer as “24 horas para o Senhor” que iluminam nossas quaresmas desde 2014.
Longe de ser uma resposta desencarnada, rezar pelos outros torna presente a vivência dos dois mandamentos. A oração é prova de amor e confiança em Deus e gesto primeiro de caridade pelo próximo. O mundo parece ter respostas para tudo, essa autossuficiência distancia o homem de Deus, e mais do que isso, distancia o homem do caminho de vida nova que vem de Deus. Nos tornamos amargos, mesquinhos, indiferentes, cheios de razão. Aceitamos e encorajamos leituras e soluções para problemas das nossas vidas e da sociedade que não são evangélicas. A oração amolece nossos corações revelando nossa pequenez e se torna força porque deixa espaço para que o Senhor conduza nossas vidas. A humildade da oração faz com que sejamos eternos discípulos do Mestre que, todos os dias, “torna nova todas as coisas”.
Rezar por irmãos que sofrem a quilômetros da nossa “terrinha” é declarar guerra à indiferença. Rezando, a vida do outro tem valor para mim, eu o amo como irmão e aprendo olhar cada pessoa como um filho amado de Deus, e sonhar para cada uma delas o sonho de Deus. Infelizmente no Brasil, num país “católico”, estamos perdendo a graça da fraternidade universal, basta ver nossas intervenções na internet, quantos insultos, quanta falta de paciência e quanto julgamento. Precisamos de uma conversão enorme neste sentido. É o amor para com o próximo que distingue o discípulo de Jesus (cf. Jo 13,35). Nos convidando a rezar pelos nossos irmãos congoleses e sudaneses o papa nos arranca do nosso egocentrismo, e faz de nós melhores cristãos, mais parecidos com o Senhor.
A República Democrática do Congo, antigo Zaire, é um dos 54 países do Continente Africano. Colônia Belga durante quase cem anos, o gigante africano (segundo maior país do continente) rico em minérios, sempre foi visto como uma terra a ser explorada. Ele foi vítima da ganância dos países ricos e dos seus próprios dirigentes, conheceu uma colonização selvagem, a ditadura de Mobutu e as consequências violentas da guerra do Ruanda, a violência dos insaciados do seu ouro, diamante, cobre e cobalto e ultimamente a ditadura do Presidente Kabila (no poder desde 2003). Apesar de tudo, o povo congolês é alegre, forte e dinâmico, nunca cruzou os braços frente à injustiça. As comunidades cristãs são numerosas, fontes de vocações à vida sacerdotal e religiosa, e já provaram várias vezes sua coragem até o martírio. Nestes últimos dias, o Cardeal Monsenguwo se tornou a grande voz contra a ditadura do presidente Kabila, sua audácia alimenta a força do povo que busca com esperança uma mudança pacífica no país. Infelizmente a repressão contra os manifestantes é grande. Desaparecidos, mortos e feridos pintam o quadro de um país onde as autoridades esqueceram que elas estão à serviço de uma nação que só busca viver melhor.
A situação na República do Sudão do Sul não é tão diferente. O mais jovem país africano, que ganhou sua independência do Sudão em 2011, vive atualmente uma guerra civil entre os defensores do presidente Salva Kiir e os do vice-presidente, hoje fugitivo político, Riek Machar. Os resultados são assustadores, de 50 a 300 mil possíveis mortes, quase 1 milhão de refugiados em países vizinhos e aproximativamente 15 mil crianças-soldados. Várias paróquias deixaram de ter uma vida normal, pois muitos padres e irmãs nãos moram mais nos vilarejos, por segurança eles são obrigados a viver na cúria diocesana e visitar quando possível as comunidades. É do Sudão do Sul que vem a Santa Josefina Bakhita, é o no Sudão que São Daniel Comboni, fundador dos missionários combonianos, exerceu seu ministério episcopal. Do Congo vem dois bem-aventurados e mártires, Clementina Anuarite e Isidore Bakanja. Que essas terras tocadas por Deus possam se tornar um lugar de paz, desenvolvimento e justiça para todos. Que a coragem dos cristãos destes dois países possa reacender a chama da fraternidade universal entre nós cristãos brasileiros.
Por fim, peço orações pelo país onde vivo, o Chade. Um outro país africano que passa por um momento difícil de crise financeira e política. Todos os funcionários do estado, professores, médicos, enfermeiros, entraram em uma greve geral e paralisaram o país. Eles esperam receber os salários atrasados. As manifestações foram proibidas, a repressão aumenta e já constatamos inúmeras prisões contestáveis. As escolas estão fechadas e nossos jovens perdem a esperança. Contamos com vossas orações.
Que Deus abençoe cada um de vocês que se dedicarão com fé e coragem nesta jornada do dia 23 de fevereiro. A presença de Deus transformará os corações dos que rezam e tocará os corações dos homens poderosos que criam tanto sofrimento na vida dos pequenos. Um grande abraço e boa caminhada rumo à festa da Ressurreição.
Pe Adriano (Tillã), missionário xaveriano.
FONTE: Missionários Xaverianos